Rip Van Winkle
Washington Irving
Autor, escritor, contista, ensaísta, poeta, biógrafo e colunista americano nascido em Nova York, com uma obra às vezes satírica, às vezes onírica, foi o primeiro escritor americano a ganhar fama internacional. Trabalhou e estudou direito nos escritórios de Henry Masterton, Brockholst Livingston e John Ogde Hoffman, praticou leis por um breve período e viajou pela Europa, onde visitou Marseilles, Gênova e Sicília, onde conheceu o famoso oficial naval inglês, o Lord Nelson, e encontrou-se com o pintor Washintong Allston, em Roma. Iniciou a carreira literária escrevendo para jornais e revistas. Contribuiu para o Morning Chronicle, editado por seu irmão Peter Irving, e publicou Salmagundi, uma coletânea de sátiras sobre a sociedade nova-iorquina, sua primeira obra de vulto, escrevendo em colaboração com seu irmão William Irving e o cunhado deste, James Kirke Paulding. Em seguida apresentou History of New York from the Beginning of the World to the End of the Dutch Dinasty by Diedrich Knickerbocker, sátira aos colonos holandeses. Foi um dos editores do Analetic magazine na Philadelphia e New York. Com a morte da mãe, a guerra e os negócios com seus irmãos em queda, voltou à Europa, onde morou 17 anos, vivendo em Liverpool, Dresden, Londres e Paris, e trabalhando na U.S. Embassy em Madrid e depois foi secretário da American Legation trabalhando para Martin Van Buren. Neste período escreveu o livro de contos que o tornou famoso: The Sketch Book of Geoffrey Crayon, fruto de sua amizade com Sir Walter Scott. Escreveu ainda Tales of a Traveler, A Chronicle of the Conquest of Granada e The Alhambra, inspirados na pitoresca tradição árabe da Andaluzia, que conheceu quando viveu na Espanha como embaixador, além de Columbus e The Companions of Columbus. Depois de 17 anos de ausência, voltou aos Estados Unidos, onde foi recebido com entusiasmo, como o primeiro escritor estadunidense de fama internacional. Morando em sua propriedade Sunnyside, na cidade de Tarrytown-on-Hudson, Nova York, viajou então pelo país até ser nomeado embaixador dos EUA na Espanha. De volta a Tarrytown foi Presidente da Astor Library, depois New York Public Library. Viveu seus últimos anos e morreu em sua propriedade de Sunnyside.
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Apresentação da Obra
Washington Irving
Adaptação de Paulo Sérgio de Vasconcello
Quem quer que tenha subido
pelo rio Hudson deve lembrar-se das montanhas Kaatskill, que se
avistam ao longe. Cada mudança de estação e de tempo e cada
hora do dia provocam alguma mudança nas cores e nos contornos
mágicos dessas montanhas. Todas as boas esposas da região as
tomam como barômetros, pois, de acordo com sua aparência, conseguem
prever o tempo.
Ao pé dessas belas montanhas, o
viajante pode avistar fumaça se erguendo lentamente de uma aldeia
cujos telhados brilham por entre as árvores. É uma aldeia muito
antiga, que foi fundada por algum colonizador holandês.
Nessa aldeia e em uma dessas casas
(que, a bem da verdade, eram muito antigas e castigadas pelo mau
tempo), vivia, há muitos anos, quando os Estados Unidos ainda eram uma
província da Grã-Bretanha, um homem simples e bom chamado Rip Van
Winkle.
Era um vizinho exemplar e um
marido obediente, completamente dominado pela mulher. Certamente devia a
essa última circunstância a brandura de alma que lhe
conquistava uma popularidade geral, pois são mais aptos a serem dóceis e
conciliadores fora, esses homens que estão sob a disciplina de uma
víbora dentro de casa.
Rip Van Winkle era o grande
favorito entre todas as boas esposas da aldeia; as crianças também
gritavam de alegria sempre que ele se aproximava. Assistia a seus
jogos, fabricava seus brinquedos, ensinava-lhes a soltar pipa e
atirar bolinhas de gude e lhes contava longas histórias de fantasmas,
bruxas e índios. Aonde quer que ele fosse, era cercado por um bando
deles, pendurando-se nas suas roupas, subindo às suas costas e lhe
pregando mil peças
impunemente. Nem um cachorro sequer, em toda a redondeza, latia para ele.
O grande defeito de caráter
de Rip era uma insuperável aversão a qualquer tipo de trabalho
útil. Não era falta de assiduidade ou perseverança, pois ele
seria capaz de sentar numa rocha úmida, com uma vara, e ficar
pescando o dia todo, sem uma queixa, mesmo que sua isca não fosse
mordida nem uma só vez.
Carregaria ao ombro sua espingarda por horas seguidas, caminhando
por bosques e pântanos, subindo e descendo morros, para atirar em
alguns poucos esquilos ou pombas selvagens. Jamais
se recusaria a ajudar um vizinho,
mesmo nas tarefas mais duras. As mulheres da aldeia, também, tinham
o costume de recorrer a ele para pequenos serviços que seus
maridos menos prestativos não fariam por elas. Numa palavra,
Rip estava sempre pronto para
cuidar dos negócios de quem
quer que fosse, exceto dos dele próprio. Mas cumprir os deveres
para com a família e manter sua fazenda em ordem, ele achava impossível.
De fato, dizia que não
adiantava nada trabalhar em sua fazenda: era o pior pedaço de terra
de toda a região. Tudo ali dava errado e daria errado apesar dele.
Suas cercas estavam sempre
caindo aos pedaços; sua vaca
sempre se perdia ou ia parar na plantação de couve. A erva-daninha
certamente crescia mais rápido em suas terras do que em nenhum
outro lugar. A chuva fazia questão de cair exatamente quando
ele tinha algum trabalho para fazer ao ar livre. Assim, a
propriedade que herdara do pai, diminuindo até ficar reduzida a
pouco mais que um simples terreno com milho e batatas, era a fazenda em
piores condições de toda a
redondeza.
Seus filhos também andavam
maltrapilhos e selvagens como se não tivessem pais. Seu filho Rip, um
moleque igualzinho a ele, fazia prever que ia herdar-lhe os hábitos,
junto com as suas roupas velhas. Viam-no geralmente correndo como um
potro atrás da mãe,
vestido com um velho par de calças do pai, que ele tinha muita dificuldade em segurar com uma mão.
Rip Van Winkle, porém, era um
desses felizes mortais bemhumorados, sempre de bem com a vida,
comendo pão branco ou preto: o que se pudesse conseguir com
menor esforço ou
dificuldade. Preferia definhar com
um centavo a trabalhar por uma libra. Se deixado a si mesmo, ele
teria passado a vida a assobiar, com perfeita satisfação; mas sua
mulher vivia resmungando nos seus ouvidos sobre sua preguiça, sua
negligência e a ruína a que ele
estava levando sua família. De
manhã, à tarde e à noite, sua língua estava em ação sem trégua,
reclamando de tudo o que ele dizia ou fazia. Rip só tinha um modo
de responder: encolhia os ombros, balançava a cabeça, erguia os
olhos, mas não dizia nada. Isso,
porém, provocava uma nova enxurrada
de queixas e só lhe restava, então, ir para fora de casa — o único lugar
que realmente pertence a um marido dominado pela esposa.
O único a tomar partido de Rip
em seu lar era seu cachorro Wolf, tão tiranizado pela Senhora
Van Winkle quanto seu dono, pois aquela os via como companheiros de
preguiça e olhava torto para Wolf como se ele fosse a causa das
perambulagens freqüentes do
marido. A verdade é que Wolf
era, sob todos os aspectos, um cachorro digno; era corajoso —
mas que coragem podia enfrentar os constantes e esmagadores ataques de
uma língua de mulher? Assim que Wolf entrava na casa, baixava a crista,
com
o rabo entre as pernas,
olhando atentamente para a senhora Van Winkle. Ao primeiro
sacudir de um cabo de vassoura ou de uma concha, saía correndo
para a porta, latindo.
Foi ficando pior para Rip Van
Winkle com o passar dos anos de casamento. Um temperamento azedo
jamais se abranda com o tempo, e uma língua afiada é o único
instrumento cortante que se torna mais agudo com o uso constante.
Por muito tempo, ele costumava consolar-se, ao ser expulso de
casa, freqüentando uma espécie de clube dos sábios, filósofos e
outros personagens preguiçosos da aldeia. Suas sessões ocorriam num
banco na frente
de uma pequena pousada. Ali
costumavam se sentar à sombra, durante um longo e preguiçoso
dia de verão, conversando distraidamente sobre mexericos da
aldeia ou contando histórias intermináveis e tediosas sobre
coisa nenhuma. Se lhes caía nas
mãos algum jornal deixado por um
viajante de passagem, era lido arrastadamente por Derrick Van
Bummel, o mestre-escola, um homenzinho vivo e instruído, que
não se deixava assustar pela palavra mais gigantesca do
dicionário. Como deliberavam sabiamente sobre acontecimentos
públicos alguns meses depois que eles tinham ocorrido!
As opiniões dessa liga eram
totalmente controladas por Nicholas Vedder, um patriarca da aldeia e
dono da pousada, a cuja porta ele permanecia sentado de manhã até a
noite, só se movendo para evitar o sol e continuar sob a sombra de
uma grande árvore.
Assim, os vizinhos podiam
saber que horas eram a partir de seus movimentos, de uma
forma tão precisa quanto consultando um relógio de sol. É verdade
que raramente escutavam-no a falar, mas fumava seu cachimbo sem
parar. Seus partidários, porém, compreendiam-no perfeitamente o
que ia pela sua cabeça, de acordo com o modo como ele fumava.
Mas até mesmo desse refúgio o
desafortunado Rip foi por fim expulso pela megera da sua esposa,
que irrompeu de repente na tranqüilidade da assembléia e chamou
todos os seus membros de inúteis. Nem aquela venerável
personagem, o próprio Nicholas
Vedder, foi poupado da língua atrevida dessa terrível víbora, que o acusava de encorajar os hábitos preguiçosos do marido.
O pobre Rip se viu por fim
quase reduzido ao desespero; e sua única alternativa para
escapar do trabalho da fazenda e da gritaria da mulher era
pegar sua espingarda e perambular pelas florestas. Aqui ele algumas
vezes se sentava ao pé de uma árvore e
dividia o conteúdo de sua bolsa com
Wolf, com quem simpatizava como um companheiro de sofrimento.
“Pobre Wolf”, dizia, “sua dona dá a você uma vida de cão, mas não se
preocupe, meu amigo: enquanto eu viver, você nunca sentirá falta
de um companheiro para ficar a seu lado!” Wolf abanava o rabo,
olhava atentamente para o rosto do seu dono e, se cães podem
sentir piedade, eu acredito realmente que ele demonstrava os mesmos
sentimentos do
dono com todo seu coração.
Numa dessas longas andanças, num
belo dia de outono, tinha escalado, sem dar por isso, uma das
partes mais altas das montanhas Kaatskill. Estava entretido em
seu esporte favorito —
caçar esquilos, e a solidão
silenciosa das rochas tinha ecoado repetidamente os estampidos
de sua espingarda. Ofegante e cansado, lançou-se sobre uma
colina verde, à beira de um precipício. De uma abertura entre as
árvores ele podia avistar toda
a região mais abaixo, a grande
distância. Viu o altivo Hudson, longe, longe, movendo-se em seu
curso silencioso mas majestoso.
Do outro lado, avistou um vale
profundo, selvagem, solitário e eriçado; o fundo estava repleto
de pedaços de rochas e escassamente iluminado pelos reflexos do
sol poente. Por algum
tempo Rip permaneceu ali, deitado, meditando sobre aquela cena.
A noite estava avançando pouco
a pouco. As montanhas começavam a lançar suas sombras azuis sobre os
vales. Ele viu que escureceria muito antes de poder chegar à
aldeia e suspirou profundamente ao pensar nas ameaças da Senhora Van
Winkle que
ele teria de enfrentar.
A ponto de descer, ouviu uma
voz chamando-o: “Rip Van Winkle! Rip Van Winkle!” Olhou ao
redor, mas não conseguiu ver nada além de um corvo num vôo
solitário através da montanha. Pensou que sua imaginação o enganara e
se preparou de novo para descer, quando ouviu o mesmo grito
soar através do calmo ar da noite: “Rip Van Winkle! Rip Van Winkle!”
No mesmo momento, Wolf eriçou os pêlos das costas e, dando um
fraco rosnado, refugiou-se bem junto do dono, olhando assustado para
o vale. Rip agora sentia uma vaga apreensão. Olhou ansiosamente
na mesma direção e percebeu uma figura estranha escalando
vagarosamente as rochas e curvada sob o peso de algo
que carregava às costas. Ele ficou surpreso ao ver um ser
humano naquele lugar solitário e deserto, mas julgando que era algum
dos vizinhos precisando de sua ajuda, correu a oferecê-la.
Ao chegar mais perto, ficou
ainda mais espantado com a singularidade da aparência do
estranho. Era um velho baixo, de fartos cabelos eriçados e
barba grisalha. Vestia-se à antiga moda holandesa, com uma
jaqueta e vários calções. Carregava aos
ombros um barril, que parecia
cheio de licor, e fazia sinais a Rip para que ele se aproximasse
e ajudasse com o fardo. Embora ressabiado e desconfiado dessa
nova amizade, Rip o fez com sua presteza habitual. Ajudando-se um
ao outro, subiram um barranco,
que parecia o leito seco de
uma corrente da montanha. Quando escalavam, Rip ouviu um barulho
como que de um trovão distante.
Parou por um momento, mas
supondo que era um desses trovões que anunciam uma pancada de água,
prosseguiu. Chegaram a uma cavidade que parecia um pequeno
anfiteatro, cercado por precipícios e árvores. Durante todo o tempo,
Rip e seu companheiro tinham subido a montanha em silêncio.
Embora o primeiro se perguntasse admirado qual a razão de se
carregar um barril de licor montanha acima, havia algo estranho
e incompreensível no desconhecido que inspirava medo e impedia
a intimidade da conversa.
Ao entrarem no anfiteatro,
apareceram outros motivos de espanto. No centro havia um grupo de
homens esquisitos jogando um antigo jogo de bola holandês. Vestiam,
todos, roupas estranhas.
Seus rostos, também, eram
especiais. Um tinha uma grande barba, rosto cheio e olhinhos de
porco. A face de um outro parecia consistir inteiramente num
nariz, encimado por um chapéu branco com uma pena vermelha de
galo. Todos tinham barba, de vários formatos e cores. Havia um que
parecia ser o líder. Era um velho forte; tinha um chapéu com penas,
meias vermelhas e sapatos de salto alto, com rosas. O grupo em seu
conjunto lembrava a Rip as
figuras de uma velha pintura
flamenga, que ele vira na sala de Dominic Van Shaick, o
vigário da aldeia, trazida da Holanda no tempo da colonização.
O que parecia particularmente
estranho a Rip era que, embora aquelas pessoas estivessem se divertindo,
mantinham no rosto uma expressão das mais sérias, o mais
misterioso silêncio: era a diversão mais melancólica que ele já
tinha testemunhado. Nada interrompia o silêncio da cena, exceto
o ruído das bolas, que, ao rolar, ecoavam através das montanhas
como barulho de trovão.
Quando Rip e seu companheiro
se aproximaram, eles de repente desistiram do seu jogo e o
encararam com um olhar tão fixo de estátua e com rostos tão
estranhos e sem vida, que seu coração disparou e seus joelhos
se chocaram entre si. Seu companheiro esvaziava agora o conteúdo do
barril em garrafões e fazia sinais para que ele servisse o grupo.
Obedeceu com medo e tremendo; eles beberam o licor em profundo silêncio e
retornaram
ao jogo.
Pouco a pouco o medo e a apreensão de Rip diminuíram. Até se aventurou, quando nenhum olhar estava fixado nele, a saborear o licor, que tinha o gosto das melhores bebidas holandesas. Era, por natureza, uma alma sedenta e logo se viu tentado a repetir a dose. Um gole leva a outro, e ele repetiu suas visitas ao garrafão tantas vezes que, por fim, seus sentidos se enfraqueceram, seus olhos se turvaram, sua cabeça foi gradualmente tombando e ele caiu num sono profundo.
Ao acordar, descobriu-se na colina verde de onde tinha visto pela primeira vez o velho que vinha subindo a montanha. Esfregou os olhos — era uma esplêndida manhã ensolarada. Pássaros
Pouco a pouco o medo e a apreensão de Rip diminuíram. Até se aventurou, quando nenhum olhar estava fixado nele, a saborear o licor, que tinha o gosto das melhores bebidas holandesas. Era, por natureza, uma alma sedenta e logo se viu tentado a repetir a dose. Um gole leva a outro, e ele repetiu suas visitas ao garrafão tantas vezes que, por fim, seus sentidos se enfraqueceram, seus olhos se turvaram, sua cabeça foi gradualmente tombando e ele caiu num sono profundo.
Ao acordar, descobriu-se na colina verde de onde tinha visto pela primeira vez o velho que vinha subindo a montanha. Esfregou os olhos — era uma esplêndida manhã ensolarada. Pássaros
saltitavam e cantavam por entre
a mata. “Com certeza”, pensou Rip, “não devo ter dormido aqui
a noite toda”. Recordou o que acontecera antes de adormecer. O
homem estranho com um barril de licor, o barranco, o retiro selvagem
entre as rochas, o triste jogo de bola, o garrafão. “Oh!, aquele
garrafão! Maldito garrafão!”, pensou Rip, “quantas desculpas eu
devo pedir à Senhora Van Winkle!”
Procurou por sua arma, mas em
seu lugar encontrou apenas uma espingarda toda corroída de
ferrugem. Suspeitava agora de que os homens da montanha tinham lhe
pregado uma peça: depois de o embebedar com o licor, tinham
roubado sua espingarda.
Também Wolf tinha desaparecido, mas
bem podia ter corrido atrás de um esquilo ou de uma perdiz.
Assobiou chamando-o e gritou seu nome, mas tudo em vão; os ecos
repetiam seu assobio e grito, mas não se viu nenhum cachorro.
Decidiu revisitar a cena do
dia anterior e, se encontrasse alguém do jogo, pedir seu cachorro e
sua espingarda. Ao se erguer, notou que suas juntas estavam
rígidas e mais fracas do que o normal. “Essas camas de montanha
não são comigo”, pensou Rip, “e se eu ficar com reumatismo, terei
de agüentar a Senhora Van Winkle por um bom tempo”. Com alguma
dificuldade, desceu ao barranco onde tinha estado com o
companheiro na véspera. Mas,
para seu espanto, havia agora ali uma corrente de água da montanha, saltando de rocha a rocha.
Por fim, chegou ao que era o anfiteatro, mas não encontrou nenhum sinal da escavação que havia antes. As rochas apresentavam uma parede alta, intransponível, sobre a qual corriam as águas, rodeadas pelas sombras de uma floresta. Aqui, então, o pobre Rip foi obrigado a parar. De novo assobiou e chamou pelo cão, inutilmente. Que deveria fazer? A manhã já ia alta, e Rip, sentindo falta do café da manhã, sentia-se faminto. Lamentava deixar seu cachorro e sua espingarda, temia encontrar a esposa, mas não podia morrer de fome nas montanhas. Sacudiu a cabeça, pôs no ombro a espingarda enferrujada e, com o coração cheio de
Por fim, chegou ao que era o anfiteatro, mas não encontrou nenhum sinal da escavação que havia antes. As rochas apresentavam uma parede alta, intransponível, sobre a qual corriam as águas, rodeadas pelas sombras de uma floresta. Aqui, então, o pobre Rip foi obrigado a parar. De novo assobiou e chamou pelo cão, inutilmente. Que deveria fazer? A manhã já ia alta, e Rip, sentindo falta do café da manhã, sentia-se faminto. Lamentava deixar seu cachorro e sua espingarda, temia encontrar a esposa, mas não podia morrer de fome nas montanhas. Sacudiu a cabeça, pôs no ombro a espingarda enferrujada e, com o coração cheio de
preocupação e ansiedade, dirigiu seus passos para casa.
Ao se aproximar da aldeia,
encontrou algumas pessoas, mas nenhuma conhecida, o que o surpreendeu
um bocado, pois achava que conhecia todos na região. Também suas
roupas eram de um tipo diferente daquele com o qual ele
estava acostumado. Todos olhavam fixamente para ele, com os
mesmos sinais de espanto, e coçavam o queixo. A repetição
constante desse gesto levou Rip a fazer involuntariamente o mesmo e
foi quando, para sua surpresa, descobriu que sua barba tinha crescido um
pé!
Agora, tinha chegado aos
limites da aldeia. Um grupo de crianças desconhecidas correu atrás
dele, gritando e apontando sua barba grisalha. Também os cães, que
ele não reconheceu, latiam para ele à sua passagem. Toda a aldeia
tinha mudado. Estava maior e mais povoada. Havia fileiras de casas que
ele jamais tinha visto antes e as que lhe eram familiares
tinham desaparecido. Havia nomes desconhecidos sobre as portas,
rostos desconhecidos às janelas; tudo era desconhecido. Duvidava
do seu próprio juízo; começou a achar que talvez ele e o mundo a sua
volta estivessem enfeitiçados. Certamente esta era sua aldeia natal,
que ele deixara
na véspera. Ali se erguiam as
montanhas Kaatskill, ali corria o prateado Hudson. Rip estava
dolorosamente perplexo. “Aquele garrafão de ontem à noite”,
pensou, “perturbou a minha pobre cabecinha!”
Foi com alguma dificuldade que
encontrou o caminho para sua casa, da qual ele se aproximou com medo
silencioso, esperando a cada momento ouvir a voz estridente da
Senhora Van Winkle.
Encontrou a casa em ruínas: o teto
caído, as janelas arrebentadas e as portas fora das dobradiças. Um cão
meio morto de fome, que se parecia com Wolf, vagava por ali. Rip
chamou-lhe pelo nome, mas o vira-lata rosnou, mostrou os dentes e
foi embora. “Até o meu próprio cachorro”, suspirou o pobre Rip,
“esqueceu-se de mim!”
Entrou na casa. Estava vazia e, segundo parecia, abandonada.
Chamou em voz alta pela esposa e
filhos — os aposentos desertos ressoaram com sua voz por um momento e,
então, tudo voltou ao silêncio de antes.
Correu para o seu velho refúgio, a
pousada da aldeia — mas ela também tinha desaparecido. Estava em
seu lugar uma construção de janelas largas, sobre cuja porta
estava pintado:
“Hotel União, de Jonathan Doolittle”. Ao
invés da grande árvore que costumava proteger a calma pousada
holandesa, havia um mastro com uma bandeira; nela, uma estranha
mistura de estrelas e listras — tudo isso era incompreensível e
estranho.
Havia, como sempre, uma multidão de
pessoas perto da porta, mas nenhuma que Rip reconhecesse. Até o caráter
do povo parecia mudado. Ao invés da calma habitual, as pessoas eram
apressadas e agitadas. Procurou em vão pelo sábio Nicholas Vedder ou por
Van
Bummel, o mestre-escola.
Rip, com
sua longa barba grisalha, sua espingarda enferrujada, sua roupa
grosseira logo atraiu a atenção dos homens do hotel. Cercaram-no,
olhando-o dos pés à cabeça com grande curiosidade. Perguntaram em
quem ele tinha votado. Rip arregalou os olhos, sem entender nada.
Um homem puxou-o pelo braço e perguntou se ele era federalista
ou democrata. Rip não conseguia entender a pergunta. Por fim um
velho lhe perguntou, em tom grave, o que ele fazia numa eleição com
uma arma ao ombro e uma multidão a segui-lo e se ele queria
liderar uma revolta na aldeia.
“Ai!, senhores”, exclamou Rip, “eu sou um pobre coitado, pacífico, natural deste lugar”. E o pobre homem assegurou, humildemente, que não pretendia armar confusão mas que viera ali apenas para procurar alguns dos seus vizinhos, que costumavam reunir-se
“Ai!, senhores”, exclamou Rip, “eu sou um pobre coitado, pacífico, natural deste lugar”. E o pobre homem assegurou, humildemente, que não pretendia armar confusão mas que viera ali apenas para procurar alguns dos seus vizinhos, que costumavam reunir-se
naquele lugar.
“Bem, quem são eles?”, ouviu-se perguntar, “Diga seus nomes”.
Rip pensou por um momento e indagou: “Onde está Nicholas Vedder?”
Houve silêncio por um instante, até
que um velho respondeu: “Nicholas Vedder? Está morto e enterrado há
dezoito anos! Havia uma lápide de madeira, no cemitério, que contava
tudo sobre ele, mas apodreceu e sumiu”.
“Onde está Brom Dutcher?”
“Oh, alistou-se no exército,
logo no começo da guerra; uns dizem que ele morreu em combate,
outros que se afogou. Não sei, ele nunca mais voltou”.
“Onde está Van Bummel, o mestre-escola?”
“Alistou-se também, foi um grande general e agora está no Congresso”.
O coração de Rip se partiu ao ouvir
essas tristes mudanças e ao ver-se assim, sozinho no mundo. Cada
resposta o confundia, em se tratando de tão grandes lapsos de tempo
e de assuntos que ele não conseguia entender. Não tinha
coragem de perguntar por outros amigos, mas gritou desesperado:
“Ninguém aqui conhece Rip Van Winkle?”
“Oh, Rip Van Winkle!”, exclamaram dois ou três, “Oh, claro!
Aquele ali, encostado na árvore, é Rip Van Winkle”.
Rip olhou e avistou uma réplica
exata de si mesmo no tempo em que ele subiu a montanha. O pobre
coitado estava agora completamente confuso. Duvidava de sua própria
identidade, sem
saber se era ele mesmo ou um
outro qualquer. Em meio a esse embaraço, perguntaram-lhe quem ele
era e qual era seu nome.
“Só Deus sabe”, exclamou.” Não sou eu mesmo... sou uma outra pessoa...aquele ali é que sou eu...não... alguém tomou o meu lugar... Eu era eu mesmo a noite passada, mas adormeci na montanha e mudaram minha espingarda e tudo mudou, e eu mudei, e não sei dizer qual o meu nome ou quem sou eu!”
“Só Deus sabe”, exclamou.” Não sou eu mesmo... sou uma outra pessoa...aquele ali é que sou eu...não... alguém tomou o meu lugar... Eu era eu mesmo a noite passada, mas adormeci na montanha e mudaram minha espingarda e tudo mudou, e eu mudei, e não sei dizer qual o meu nome ou quem sou eu!”
Os que estavam presentes começaram
então a olhar um para o outro, balançavam a cabeça, piscavam os olhos e
passavam o dedo pela testa para dar a entender que o homem
estava doido. Nesse momento, uma bela mulher abriu caminho na
multidão para dar
uma olhada no velho de barba
grisalha. Trazia nos braços uma criança gorducha, que, assustada
com o olhar de Rip, começou a chorar. “Quieto, Rip”, gritou ela,
“quieto, seu bobinho; o velho não vai machucar você”. O nome da criança,
a aparência da mãe, o tom
de sua voz, tudo despertava um monte de recordações na mente de Rip. “Qual é o seu nome, minha boa mulher?”, perguntou.
“Judith Gardiner”.
“E o nome do seu pai?”
“Ah, pobre homem, Rip Van Winkle
era seu nome, mas faz vinte anos que ele saiu de casa com sua
espingarda e nunca mais se ouviu falar dele... Seu cachorro voltou
para casa sozinho, mas se ele se matou ou se os índios o
raptaram, ninguém pode dizer. Na
época, eu era uma garotinha”.
Rip só tinha mais uma pergunta a fazer, mas a fez com a voz tremendo:
“Onde está sua mãe?”
“Oh, ela também morreu, mas há pouco
tempo; rebentou um vaso sangüíneo num acesso de cólera contra
um vendedor ambulante”.
Havia naquilo uma ponta de
consolo. Não pôde se conter mais. Abraçou sua filha e o filho
dela. “Sou seu pai!”, gritou.
“Jovem Rip Van Winkle, em outros tempos...velho Rip Van
Winkle, agora!...Ninguém reconhece o pobre Rip Van Winkle?”
Todos ficaram admirados, até
que uma velha, destacando-se da multidão, colocou sua mão na
sobrancelha e, olhando atentamente para o rosto de Rip por um momento,
exclamou: “Não
resta dúvida! É Rip Van Winkle... é
ele mesmo! Bem-vindo em sua volta para casa, velho vizinho. Mas onde
você esteve nesses vinte longos anos?”
A história de Rip foi narrada
brevemente, pois os vinte anos tinham sido para ele apenas uma única
noite. Os vizinhos ficaram espantados ao ouvi-la. Viram-se alguns
piscarem o olho e fazer sinal de que achavam o homem louco.
Decidiu-se, porém, ouvir a opinião do velho Peter Vanderdonk.
Era o mais antigo morador da aldeia e conhecedor de todos os
acontecimentos extraordinários da redondeza. Reconheceu
Rip imediatamente e confirmou
sua história da maneira mais satisfatória. Assegurou ao grupo
que era fato estabelecido que as montanhas Kaatskill eram
freqüentadas por seres estranhos. Seu pai os tinha visto uma
vez, em seus antigos trajes holandeses, jogando bola numa
cavidade da montanha. Ele próprio havia ouvido, numa tarde de
verão, o som de suas bolas, como barulho remoto de trovão.
Para encurtar a história, o grupo se
desfez e voltou a cuidar de algo mais importante, a eleição. A filha de
Rip o levou para morar em sua casa confortável e bem mobiliada junto
com ela e o marido.
Rip lembrou que ele era um dos
meninos que costumavam trepar às suas costas. Quanto ao filho e
herdeiro de Rip, que era a sua imagem, trabalhava na fazenda,
mas revelava uma tendência hereditária a só fazer o que lhe
interessava.
Rip agora retomava seus velhos
hábitos. Encontrou muitos de seus antigos companheiros, mas todos
tinham sofrido os estragos da passagem do tempo. Preferia fazer
amigos entre a nova geração, entre a qual se tornou logo muito popular.
Sem nada para fazer em casa e
tendo chegado àquela idade feliz em que um homem pode ser preguiçoso
impunemente, tomou lugar mais uma vez no banco junto à porta
da pousada e era reverenciado como um dos patriarcas da aldeia. Levou
tempo para conseguir conversar normalmente ou compreender os
estranhos acontecimentos que tinham ocorrido durante seu sono.
Tinha havido uma guerra revolucionária, o país se libertara da
Inglaterra e agora ele era um cidadão livre dos Estados Unidos. Na
verdade, Rip não se interessava por política; as mudanças de
estados e impérios pouco o impressionavam; mas havia uma
espécie de tirania sob a qual ele sofrera muito tempo, a feminina.
Felizmente chegara ao fim; livrara o pescoço do jugo do matrimônio
e podia entrar e sair quando lhe desse na telha, sem temer a
tirania da Senhora Van Rinkle. Sempre que seu nome era
mencionado, porém, ele sacudia a cabeça, encolhia os ombros e erguia os
olhos, o que podia passar por uma expressão de designação para com
seu destino ou alegria por sua liberdade.
Rip costumava contar sua
história a todo estrangeiro que chegava ao hotel do
Senhor.Doolittle. Viam-no, de início, alterar certos detalhes cada vez
que a contava, o que se devia, sem dúvida, ao fato de ter despertado
há tão pouco tempo. Mas, finalmente, a narrativa fixou-se
exatamente nos moldes em que a narrei, e nenhum homem, mulher
ou criança da redondeza deixava de a saber de cor. Alguns sempre
duvidavam de sua veracidade e insistiam em que Rip tinha perdido o
juízo. Os velhos habitantes holandeses, porém, acreditavam, quase todos,
nela. Ainda nos dias de hoje, jamais ouvem uma trovoada numa tarde
de verão sobre o Kaatskill sem dizer que aquele grupo de homens
estranhos estão jogando bola. E é um desejo comum a todos os maridos
tiranizados pela esposa, na redondeza, quando a vida se torna um
fardo, poderem beber um gole repousante do garrafão de Rip Van
Winkle.
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Resumo do Conto
O
conto Rip Van Winkle relata a história de um homem que era considerado
por todo o vilarejo, menos por sua esposa que sempre o criticava. Como
todas as outras noites, Rip discutiu com sua mulher. Com isso foi dar
uma volta, acabou entrando em uma floresta, e logo após subiu uma
montanha, que acabou encontrando um homem de aparência esquisita.
Decidiu então segui-lo, chegando lá Rip se deparou com uma
aldeia cheia de pessoas estranhas. Logo após tomou uma bebia que havia
encontrado no vilarejo. Posteriormente Rip adormeceu, e ao acordar se
deparou com sua espingarda enferrujada e seu cachorro Wolf não se
encontrava mais ali. Ao chegar no vilarejo onde morava ninguém o
reconhecia mais, talvez porque tenha dormido por vinte anos por efeito
da bebida. Por fim, sua filha o reconheceu chamado atenção de todo
vilarejo.
Encontrado em: http://cotquatrocontos.blogspot.com.br/
Trabalho de Literatura sobre o conto “ Rip Van Winkle” ( “O dorminhoco”)
O trabalho deverá:
ter capa ( nome, número e série);
ser redigido em folha almaço pautada;
ser manuscrito;
ser redigido com caneta (tinta azul);
ser dividido em capítulos;
Leia o primeiro capítulo do conto. Reescreva este capítulo resumidamente, ambientando-o nos dias atuais, como se Rip Van Winkle morasse numa grande, moderna e movimentada cidade. Altere apenas os detalhes que mudam com o tempo, como as atividades das pessoas, as vestimentas etc. Conserve os detalhes que não alteram, como o temperamento das pessoas.
Obs.: O seu Rip Van Winkle agora passa a morar num grande centro urbano ( Rio de Janeiro, São Paulo, Nova York, Dubai etc.),. Quais seriam suas atividades diárias? Qual a profissão dele? Seus hábitos? Tenha o cuidado de conservar as características físicas e, principalmente, as psicológicas (maneira de ser) de todas as personagens.
Obs.: Rip dormiu durante 20 anos e volta no tempo. Com quantos anos? Quais as pessoas que ele reencontra? Pensaria em mudar algo que fez parte da infância? Seu futuro seria diferente? Arrependido na vida adulta, teria a chance de mudar o seu destino? Tudo aquilo: um presente ou uma maldição? Ficaria livre da tirania da senhora Van Winkle?
Ufa!!!
Quantas possibilidades, não é mesmo??? Agora é só escrever! Mãos à obra!
Aguardarei o seu texto ansiosa!!! Até lá!!! na data de entrega e sem falta! Ok?
Encontrado em: http://cotquatrocontos.blogspot.com.br/
Trabalho de Literatura sobre o conto “ Rip Van Winkle” ( “O dorminhoco”)
O trabalho deverá:
ter capa ( nome, número e série);
ser redigido em folha almaço pautada;
ser manuscrito;
ser redigido com caneta (tinta azul);
ser dividido em capítulos;
- Atenção: redija tudo resumidamente, assimile a essência do conto! Não é cópia! Crie a sua versão!
Leia o primeiro capítulo do conto. Reescreva este capítulo resumidamente, ambientando-o nos dias atuais, como se Rip Van Winkle morasse numa grande, moderna e movimentada cidade. Altere apenas os detalhes que mudam com o tempo, como as atividades das pessoas, as vestimentas etc. Conserve os detalhes que não alteram, como o temperamento das pessoas.
Obs.: O seu Rip Van Winkle agora passa a morar num grande centro urbano ( Rio de Janeiro, São Paulo, Nova York, Dubai etc.),. Quais seriam suas atividades diárias? Qual a profissão dele? Seus hábitos? Tenha o cuidado de conservar as características físicas e, principalmente, as psicológicas (maneira de ser) de todas as personagens.
- Continue lendo. No segundo, terceiro e quarto capítulos, você apenas atualizará a ambientação. Até aqui não fará nenhuma mudança tão significativa.
- Leia o quinto capítulo do conto. Muita atenção a partir de agora: reescreva-o como se Rip Van Winkle tivesse voltado atrás no tempo, isso mesmo, ele reencontra tudo como era na sua infância: os amigos, a família, a escola etc.
Obs.: Rip dormiu durante 20 anos e volta no tempo. Com quantos anos? Quais as pessoas que ele reencontra? Pensaria em mudar algo que fez parte da infância? Seu futuro seria diferente? Arrependido na vida adulta, teria a chance de mudar o seu destino? Tudo aquilo: um presente ou uma maldição? Ficaria livre da tirania da senhora Van Winkle?
Ufa!!!
Quantas possibilidades, não é mesmo??? Agora é só escrever! Mãos à obra!
Aguardarei o seu texto ansiosa!!! Até lá!!! na data de entrega e sem falta! Ok?